[Resenha] Passarinha - Kathryn Erskine
- Luana Alves
- 6 de jul. de 2017
- 4 min de leitura
Hey!

Terminei de ler Passarinha no domingo e desde lá venho pensando que palavras usar para tentar descrevê-lo. Críticos que leram a obra usaram os termos “tocante”, “inspirador”, “obra-prima”, “notável”, “comovente”, “imperdível”, “adorável, perspicaz e pungente”. Mas creio que mais adjetivos sejam cabíveis.
TÍTULO: Passarinha
AUTORA: Kathryn Erskine
EDITORA: Valentina
ANO DE LANÇAMENTO: 2013
PÁGINAS: 224
GÊNERO: Literatura estrangeira; juvenil

Um atirador no Colégio Virginia Dare tirou a vida de três pessoas: Julianne Denise Morris, a professora Roberta L. Schneider e Devon Joseph Smith. Devon, irmão mais velho de Caitlin. Ela já tinha problemas demais antes do assassinato do irmão. Portadora da síndrome de Asperger, Caitlin já tinha dificuldades para socializar, para fazer amigos, para se comportar de uma maneira “aceitável” em público, mas ela tinha o Devon e ele sempre a ajudava a “trabalhar nisso”.
“(...) mas ele também dizia isso em relação a tudo que eu fazia. Você tem que Trabalhar Nisso, viu Scout? E eu dizia para ele EU SEI porque ele falava muito muito muito e às vezes eu não quero ouvir a mesma coisa uma duas três vezes. Principalmente quando é difícil. E Trabalhar Nisso é muito difícil. Eu Trabalho Nisso o tempo TODO. Meu dia inteiro é Trabalhar Nisso. Às vezes eu não quero mais Trabalhar Nisso. Por exemplo quando eu FINALMENTE arrumo um amigo e a Sra. Brook TIRA ELE DE MIM! É uma coisa-muito-difícil! NÃO-É-JUSTO!”

Com a morte de Devon, o pai deles fica desolado e sua atenção às necessidades de Caitlin fica ainda mais prejudicada. A única pessoa que conseguia entender, ajudar e conversar com Caitlin está morta e agora ela precisa aprender como enfrentar seu pior momento sozinha. Ao ouvir em um noticiário sobre o massacre da escola a palavra “desfecho”, ela fica obcecada em encontrar um.
“Procuro a palavra desFEcho no Dicionário e ele diz: A vivência da conclusão emocional de uma situação de vida difícil como a morte de um ente querido. Não sei como chegar a essa vivência de uma conclusão emocional por isso pergunto à Sra. Robbins, Como faço para chegar à vivência da conclusão emocional de uma situação de vida difícil?
Sua boca se abre e fecha três vezes e solta um gemido fino. Com licença, ela pede, e corre para a cozinha mas dá para ouvir o barulho dela assoando o nariz e agora também estou ouvindo papai chorando no chuveiro então cubro a cabeça com a manta de pelo de carneiro roxa e fecho os olhos e tapo os ouvidos e com os cotovelos aperto meu Dicionário com força contra o peito.”
A Caitlin não entende bem as emoções e não sabe bem como lidar com elas. Com a ajuda da orientadora da escola, porém, ela vai fazendo alguns avanços. E a cada pequena vitória dela eu vibrava e me emocionava. Fiquei com o coração apertado durante toda a leitura. Minha vontade era dar um desfecho pra Caitlin, ajuda-la, cuidar dela. Eu nunca me senti tão maternal, com tanta vontade de proteger alguém. Embora Caitlin estivesse trabalhando a empatia dela, percebi que a minha está em dia, já que senti toda a dor da Caitlin e do pai dela dentro de mim (a julgar pela quantidade de lágrimas derramadas, posso até doar um pouco da minha empatia...).
O livro é narrado em primeira pessoa pela Caitlin de uma forma linda. A inocência de criança, as metáforas que usa pra tentar explicar como se sente (o livro é repleto de simbolismos), a forma como o mundo exterior a perturba, a falta que sente do irmão, o esforço que faz para se adequar, como as outras crianças a rejeitam... ela explica tudo lindamente. Kathryn, serei eternamente grata pelo seu trabalho impecável com Passarinha.
Como o livro é narrado por uma garotinha de dez anos com Asperger, ele não segue o padrão culto da ortografia. Não é que ele contenha erros, mas Caitlin escreve de maneira bastante própria, como no uso das maiúsculas, por exemplo.
“A Sra. Johnson devolve o meu trabalho de grupo. Ela escreveu Bem Pesquisado e Muito interessante e Excelente mas embaixo ela também escreveu, Por que você usa maiúsculas no meio das frases? Não se usam maiúsculas em substantivos comuns. Só palavras especiais levam maiúsculas. Olho para o parágrafo. Não usei maiúsculas no meio das frases. Elas estão só no começo de algumas palavras. Ela colocou um X em cima do C de Coração e escreveu um c minúsculo. Não parece certo desse jeito. Tenho certeza de que ela está errada em relação às palavras especiais e às letras maiúsculas mesmo sendo uma professora. Como pode existir alguma palavra mais especial que Coração?”
O cuidado da editora Valentina com a edição está visível. Uma capa linda que combina bem com a história, o título holográfico, orelhas que dão mais firmeza para a capa estilo brochura. A diagramação está ótima e encontramos vários passarinhos pelas páginas.
(Clique sobre a imagem para ampliá-la)
Consegui entender melhor como é a Síndrome de Asperger e creio que o objetivo da autora é justamente esse, exercitar nossa empatia por quem é portador de qualquer tipo de deficiência. Ver o mundo pelos olhos da Caitlin foi extremamente educativo pra mim.
Citando Jim Trelease:
“Se não se tornar um clássico, há algo errado com todos nós.”

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